Eu já estou velha e encostada num canto, ninguém mais quer saber de mim. É,... isto sempre acontece quando você fica idosa e não tem mais aquele brilho, não é mais bonita, não é mais gostosa. Tem gente que diz que panela velha é que faz comida boa. Eu sinceramente não acredito, acho que isto é uma farsa. Tem uns que dizem que preferem as mais passadas, pois já estão mais amaciadas. Depois de muito me chutarem e de muitos isolamentos fiquei um bom tempo largada, sem ser tocada. Mas, antes por anos fui acariciada. Com o passar do tempo, a rotina foi mudando. Os encontros passaram a ser vez por outra conforme os dias e anos se sucediam. Os intervalos entre nossos encontros ficavam mais longos.
Bons tempos em que viajei muito, conheci muitos lugares, alguns bons, outros nem tanto. Lembro ainda da primeira vez que vi o mar. Foi em Ipanema. Era um dia de sol, fazia um dia lindo. Quanta gente bonita. E aquela areia, ah... Era macia e limpa, branquinha, branquinha, assim como eu.
É certo que fui mal tratada muitas vezes, mas na maioria das vezes cuidada com extrema doçura. Muitas vezes fui beijada e tratada também como troféu. Nunca me importei com isto, eu até que gostava. Sentia-me mais elevada e via o mundo por cima. Todos gostavam de mim e me disputavam como muita vontade. Uns eram grosseiros. Mas, muitos tinham classe e isto sempre foi o que mais me atraiu num homem, a sua classe e seu modo como me tocava. Aliás, estou com “ele” há mais de 15 anos. Eu o conheci quando ele tinha vinte e poucos anos. Era forte, vigoroso, um corpão, mantido por suas corridas pela Lagoa Rodrigo de Freitas ou pelas Paineiras, um atleta. Gostava de ir comigo para a praia, para o clube, para Búzios... Tinha vezes que não desgrudava de mim e ficávamos o dia inteiro juntos. Adorava quando me envolvia em seus braços.
Passeei por muitos lugares: Aterro do Flamengo, Alto da Boa Vista, Lagoa, Barra da Tijuca e depois: Laranjeiras, Gávea, Niterói, Botafogo, São Cristóvão e até Teresópolis. Enfim, conheci os melhores locais que se podia conhecer.
A minha natureza sempre foi dada para esportes, eu sempre gostei mais de futebol. Minhas irmãs já eram mais chegadas a outros esportes, vôlei, basquete e até tênis. Como eu era mais “fortinha” não servia para o vôlei, em compensação minha irmã mais rechonchuda viu-se logo no basquete, percebi logo que ela nasceu para isto.
Voltando-me para “ele”, sempre o chamei de meu dono, aliás, ele fazia questão de dizer isto a todos. Em algumas ocasiões os outros é que diziam por ele: “é dele”.
A minha idade? Esta eu não revelo, onde já se viu, perguntar isto a uma senhora? Aliás, muitos me chamam de senhora como sinal de respeito, mas eu prefiro ser chamada de você.
Hoje me sinto usada e acabada. Uma inútil. Nunca se devia ficar velha. Estou jogada num canto e lá permaneço. Estou toda flácida, dado o tempo que fiquei largada ao léo.
Gostei muito de ter ido uma vez ao Maracanã para um pelada com os amigos “dele”. Eles alugaram o campo por uma baba, e isto foi só por pouco mais de uma hora e meia. Mas foi uma bela tarde.
Pelada sempre foi uma palavra mágica para mim. No entanto, gostava mais dos campeonatos das coisas à vera mesmo, mas não há quem tire o charme de uma pelada bem disputada.
Nasci em São Paulo, mas logo vim para Rio, Lembro que era época de Copa do Mundo, assim como agora. Fui muito feliz em ter vindo para cá.
Meu dono, agora não me quer mais, assim como eu, está velho e não tem mais energia e disposição para me chutar. Embora muitos da idade dele ainda gostem de um joguinho.
Quem sou eu? Sou a bola que por muitos gramados andei. E agora busco minha redenção, pois é época de Copa e o pessoal decerto quer imitar os craques e os seus ídolos. Sai que é sua Taffarel! Oops, Dida.
Escrito às vésperas da Copa do Mundo de 2006.